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Preciso falar de algo sério, difícil de admitir e cheio de preconceitos. Eu sei por que eu mesma tinha e, por isso, me levou quase dois anos para conseguir falar a respeito com alguém. Não falei por vergonha, orgulho, medo de ser julgada. Eu tive depressão pós-parto depois do nascimento do Gabriel, meu primeiro filho.

Hoje, vivendo o puerpério do meu segundo filho João, vejo o quanto algumas coisas não foram “normais” na minha primeira experiência pós-parto. Quando ouvia sobre depressão pós-parto antes de ser mãe sempre classifiquei erroneamente essa situação como sendo um caso extremo em que a mãe se recusa a cuidar do filho recém-nascido. Mas aí o Gabriel nasceu e, como muitas coisas na maternagem, vi que a história tinha mais nuances do que o preto-no-branco.

A gravidez do Gabriel foi sonhada, planejada e curtida em cada detalhe, o parto dele foi dos sonhos e mesmo assim tive depressão pós-parto. Acho que eu confiava demais que meus super-poderes-de-diva-parideira-do-parto-natural-humanizado-potencial-mae-perfeita iriam me livrar de qualquer mal, amém. Hoje vejo que justamente a necessidade de “ser perfeita” que eu tinha na época me levou a essa condição e fez com que eu demorasse pra notar e admitir que tinha algo errado. Outro erro que cometi foi achar que depressão pós-parto só se dá imediatamente após o parto. O que percebi é que esse estado de tristeza pode se prolongar por vários meses depois do nascimento. Foi o que aconteceu comigo

Quem me acompanha há mais tempo já leu o relato dos três primeiros meses do Gabriel e sabe que os nossos primeiros quinze dias foram de uma felicidade extrema pra mim (talvez por conta da explosão de ocitocina do parto natural). Saí do parto me sentindo extremamente empoderada e capaz, tive muita força para enfrentar os primeiros dias doloridos da amamentação e não soube o que é ter baby blues (que normalmente se dá alguns dias depois do parto). Pronto, havia riscado esse item da lista. Ufa! Não tinha como ter depressão ou tristeza. Estava só alegria com o meu novo bebê em casa, até que…

Veio o refluxo, a dermatite atópica, os choros incontroláveis, o diagnóstico de APLV  e o início da dieta restritiva para continuar a amamenta-lo, os problemas para dormir do Gab e consequentemente problemas com a vizinhança, a solidão e medo dos primeiros dias que tive que passar com ele sozinho, a vergonha de não estar conseguindo dar conta, de não estar conseguindo controlar a situação por mais que eu me esforçasse ao máximo para achar soluções…

Comecei a me sentir sem ânimo para as mínimas coisas. Não tinha ânimo nem mesmo para chorar. Não estava me sentindo triste, mas sim vazia e exaurida. Estava incapaz de sentir qualquer coisa que fosse. Não conseguia me reabastecer. Eu tinha momentos de sorriso no rosto, como quando estava curtindo o Gab, mas parecia que era só aquele momento acabar que o vazio voltava. Não conseguia me concentrar em nada, parecia que meus pensamentos não paravam por um minuto mas não conseguia ter nenhuma linha de raciocínio completa. Me via sempre ansiosa e preocupada. Passei a não ter fome e, mesmo exausta, não conseguia dormir. Chegou um momento em que eu morria de medo de ficar sozinha com o Gabriel em casa, mas também morria de medo de sair com ele de casa. Em nenhum momento achei que estava em depressão.

Um pensamento que vira e mexe passava pela minha cabeça era: “Onde fui me meter? Quero minha vida de volta” Não me levem a mal, eu amava profundamente aquele serzinho e estava dando a minha vida por ele. Mas só conseguia pensar em como eu gostaria de sair daquela situação. Isso é extremamente difícil de admitir publicamente, mas ainda mais difícil de admitir internamente. Toda vez que esses pensamentos vinham na minha mente eu tentava os afastar e fingir que não existiam. Afinal de contas, que tipo de boa mãe poderia pensar coisas desse tipo? Demorei pra acreditar que não era pra ser do jeito que estava sendo e que não era normal eu estar me sentindo da maneira como eu estava me sentindo. Demorei ainda mais para admitir isso e pedir ajuda. Achava que eu ia conseguir dar conta, que aquela tristeza fazia parte do processo. Em nenhum momento achei que estava em depressão.
Naquele momento, não conseguia ver como é que ele tinha vindo para mudar minha vida pra melhor. Ouvia todas as mães ao meu redor dizendo que era a melhor coisa do mundo e eu não conseguia enxergar isso. Eu só pensava: “Alguma hora isso tem que ficar bom!” Tinha vergonha de falar sobre isso para essas outras mães que estavam tão aparentemente felizes com suas crias bem comportadas que ja dormiam a noite toda e praticamente não choravam. Olhava para o meu bebê chorão, sem dormir, querendo mamar o dia inteiro e só conseguia pensar: “Onde foi que eu errei? Por que só eu não to conseguindo dar conta?”

Mesmo com tudo isso acontecendo, em nenhum momento considerei que estivesse com depressão pós-parto! Afinal de contas, na minha cabeça, eu estava me doando e amava profundamente meu filho. Não o estava rejeitando de maneira nenhuma, como poderia estar tendo depressão pós-parto? Achava que tudo isso que eu estava sentindo era por conta das circunstâncias e que assim que as coisas melhorassem tudo aquilo também iria passar.

Aí veio o fim da licença maternidade, a volta ao trabalho, a adaptação na escolinha, as internações por conta dos problemas de saúde, a culpa por não estar conseguindo render no trabalho como antes. Eu era um zumbi ambulante, não conseguia mais ter prazer em nada, não conseguia me concentrar nas reuniões do trabalho, me sentia cansada o tempo inteiro, emagreci mais de 20kg… mas ainda assim achava que tudo isso era tudo fruto das dificuldades naturais da vida de uma mãe de criança pequena, que eu iria dar conta. Pensava que assim que as poeira assentasse eu conseguiria voltar a me sentir viva. E assim os meses foram passando…

E as coisas “se ajeitaram”. O Gab  passou a ficar saudável em casa com a babá, eu passei a ter desafios interessantes no trabalho, consegui voltar a dormir e ter mais tempo para mim. Mas qual foi minha surpresa em perceber que, mesmo assim, o desânimo, cansaço, apatia continuaram por ali?  Não tinha vontade ou força para fazer coisas simples como tomar um café ou ler um livro. Tudo era difícil demais, demandava demais. Foi quando a ficha caiu…

E nisso o Gabriel já tinha completado 1 ano de vida. Foi quando finalmente olhei pra dentro de mim mesma e percebi que aquilo tudo não era normal. Foi quando venci meu orgulho e pedi ajuda do meu marido, da minha família, de uma profissional, das minhas amigas mais próximas. Foi quando consegui perceber a avalanche que tinha me atingido e como eu precisava de ajuda pra me recuperar pois os estragos não iam se reparar sozinhos e eu, definitivamente, não tinha condições de fazer nada a respeito.

Resolvi escrever esse post agora por que tinha muito medo de que tudo acontecesse novamente depois da chegada do João e, dessa vez, eu resolvi fazer diferente. Dessa vez eu não quero tentar bancar a super-heroína, não quero me trancar em casa e tentar resolver tudo sozinha. Dessa vez eu quero ajuda mesmo, quero sair de casa, ver gente, conversar com outras mães, compartilhar o que estou passando (mesmo que me dê vergonha).

Resolvi escrever sobre isso por que, assim como eu estava me achando uma péssima mãe por estar sentindo o que eu estava sentindo, pode ter gente aí fora se sentindo assim. Resolvi escrever por que pode ter gente aí fora que, assim como eu, não sabe ou não quer admitir que está em depressão pós-parto. Ou pior, pode ter gente que julga saber o que é e não faz a mínima ideia, assim como eu antes de ser mãe.

Resolvi escrever porque o ato de escrever nesse blog e compartilhar com outras pessoas foi o que me ajudou a perceber o que estava acontecendo. Foi – e ainda tem sido – parte da minha terapia. Pode parecer, por alguns dos meus textos, que eu tenho as coisas sob controle mas eu estou em processo de cura e aquilo que eu escrevo, na verdade, é para colocar norte nos meus pensamentos e emoções e ajudar a reorganizá-los.

Resolvi escrever pra dizer pra você (e eu espero que esse texto chegue até você!) que nem sempre a alegria nasce junto com o bebê e não tem vergonha nenhuma nisso. Um dia ela chega, mas é preciso ajuda, apoio, aceitação e compreensão pra isso. Peça ajuda. Nossa força reside também em sabermos admitir nossas fraquezas. Estamos juntas! Pode contar comigo.